"Um dia, quem sabe um dia, possa mandar tudo às urtigas. Deixar de ser o palhaço de quem se esqueceu de se rir, deixar de ser o filho ideal dos pais que nunca tive, deixar de ser o amigo preocupado quando em minha natureza está a negligência. Talvez passe a preocupar-me menos com o que os outros pensam ou dizem de mim, importantes ou não, para passar a fazer apenas o que a minha vontade egoísta me pede. É possível que comece a recusar o esforço de estar, de falar, de perceber, de me colocar na pele do outro que tanta dificuldade tem de se pôr na minha. Pode ser que deixe de querer saber se me consideram isto ou aquilo e que comece a alegar que à minha volta só está quem faz falta... É altamente provável que comece a sobrevalorzar-me na ausência de alguém, justificando a ausência dessa pessoa com argumentos inúteis ou vagos como "era uma fonte de preocupações sem sentido" ou que comece mesmo a mentir-me claramente dizendo que "para complicações bastam as minhas". Nessa altura, quando a solidão bater mais fundo, agarrar-me-ei, se ainda me recordar vagamente como, à única pessoa que, de crente ou boa, se possa apegar a mim e me queira ajudar. Mesmo nessa altura, serei capaz de agredir essa pessoa na tentativa vã de demonstrar que não há falhas nos meus silogismos vitais, que não errei, que era todo o restante mundo que estava errado, que o amor e a amizade e a família não valem a pena ou não compensam o esforço que se faz por eles... O maior dano que poderei fazer não será a mim mesmo mas à pessoa a quem infecte com minha atitude magestosa e no entanto derrotista. Será que tenho em mim sementes suficientes para deixar crescer semelhante árvore? É que as árvores não precisam de ninguém para crescer. Apenas de chuva, Sol e um ocasional animal que resolva morrer junto das suas raízes... Será que as egoístas das árvores são felizes?"
(escrito algures em Novembro do ano passado.... Pensava que já tinha publicado isto)
(escrito algures em Novembro do ano passado.... Pensava que já tinha publicado isto)
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