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A mostrar mensagens de 2022

parte 1

É atirada ao material uma criança... Um bebé que viria a ser uma criança... À carne, ao físico, ao tempo e espaço. Depois, contextualiza-se e integra-se essa criança num todo... Um grupo de condicionantes e fatores de como é suposto ser tudo. Um status quo inescapável de outros seres semelhantes que surgiram antes... Expectativas, padrões, normalidades, regras e o indivíduo neófito submete-se naturalmente à força passiva dos tantos contra nada, como se não houvesse qualquer violência envolvida. Não é explicada qualquer existência de quebras ou excepções ao padrão... Até o indivíduo se aperceber que é, ele próprio, uma excepção em algo... Há nele uma latente fuga às normas e não sabe que a fuga às normas é em si mesma normal...  Este é o primeiro conflito real do ser: admitir-se excepção ou refutar-se enquanto tal. A uma criança contextualizada no tácito contato social e sobreimposto status quo, ser a excepção em algo fundamental como, digamos, um núcleo familiar standardizado, cons...
Eu levo a bordoada. Calo.  Se consigo digerir, se a bordoada é pequena, sacudo o pó e sigo. Se não consigo, disfarço a dor.  Escondo-a no meu cérebro atrás de outros químicos, Dou covardemente tempo à minha mente tempo para não reagir, Oculto a reação em algo, seja o que for, desde que me ocupe a química que faz os pensamentos.... Porque a biologia sabe que a argamassa que me compõe tem limites, A dor, se colocada em espera por outras questões mais urgentes, perde intensidade. Então faço algo. Exijo ao cérebro atenção para outra coisa. Não importa o quê ou quão ridículo. Mais tarde, provavelmente vem a quebra, O meltdown, o afogamento... Desisto e sinto a dor. Agarro-a.  Ainda estou vivo. Ainda sinto. Mesmo que dor, ainda sinto... A dor prova-me que ainda sou humano e que ainda vivo. Agarro-me a ela. E depois vem o cansaço. A dor sente-se presa e afasta-se e fica o mais grave cansaço. E eu suporto o cansaço porque não há mais que fazer ao cansaço além de o deixar estar co...
 Eu fui um monstro em forma de gente. Eu fui um traidor  Eu fui um mentiroso. Usei pessoas como objectos. Precisei disso para me sentir bem com a minha própria auto-estima de merda e só a piorei. Nada do que a vida me possa ter atirado para cima pode justificar o porquê de eu ter (mesmo inconscientemente) ESCOLHIDO o caminho mais fácil a curto prazo apenas para sofrer aos poucos até o maior sofrimento se tornar inevitável. Não importaram palavras de carinho e de apoiode amigos e familiares. Não importaram reprimendas ou castigos.  Não importou o que perdi. Não importou o quanto sofri pelas minhas decisões nem o quanto fiz sofrer com as minhas atitudes e atos.  Não importaram orações, maldições, não importaram insultos nem louvores.  Nada importou para me mudar.  Responsabilidade e ownership. Eu assumo responsabilidade por todo o sofrimento que causei.  Eu admito as minhas falhas e defeitos.  Não foram drogas, não foram vícios, não foi falta de fé ...

Minha Celephaïs

Vi nos tons pastel frios do amanhecer, entre nuvens brancas que se confundiam com alvorado ciano, o minguante cândido espreitando tímido. De repente, era uma vela enfonada bailando sobre espuma celeste num mar cinzento, partindo de novo após a devolução das almas sonhadoras aos inanimados corpos que, durante as horas sombrias e plenas de terrores indizíveis, os abandonaram como luvas vãs, vazias da matéria essencial que lhes dá o significado do ser. A escuma erguia-se e apartava-se sob quilha forte e tenaz, num mar revolto mas imaterial e quis a ilusão ou o quebranto da noite ainda imposto sobre a minha visão, que da vela-lua que agora partia, uma tênue linha de memória se formasse e estendesse gentilmente ao meu sentido. Fita rebelde de alvor e luz, como chave em ferrolho único destrancou nos recônditos da minha alma o que Morfeu despótico decretou olvido fazendo de mim ladrão vencedor do erário dos Oneiros. Em meus lábios, a prata fez-se palavra e tiniu gentil mas sonora no ar frio d...